No final desse verão, por fim, a pequena perfumaria de
Montmartre mudou-se para um local muito maior e mais confortável na Rue Cambom,
na Place Vendôme, e na região onde Claire morava e onde Paul estabeleceu o
escritório onde trabalhava, na Rue Saint Honoré esquina com a Rue D’Algert, do
outro lado da Place Vendôme, e mais pertos dos Jardins das Tulherias.
No novo edifício, o escritório e a loja de Perfumaria era
muito mais confortável para as duas que trabalhavam sem parar, enquanto o
projeto de produção de creme de beleza ia se desenvolvendo rapidamente
Foi então que numa manhã chuvosa de finais de agosto, chegou
uma carta de Recife. Claire ao ver o envelope com as bordas da bandeira
brasileira, percebeu que era do Pajé Jabu.
A carta, escrita com boa letra pelo índio Arandu, dava os
parabéns a ela pelo seu casamento. Jabú desejava toda a felicidade do mundo
para sua “Ivoti” e que sempre pensava nela. Mas tinha um parágrafo que fez
Claire gelar o sangue nas veias: “ Tome
muito cuidado, minha querida Ivoti, para não se confrontar com o seu passado.
Tive um sonho, em que o seu passado e o seu presente estão prestes a se juntar,
não sei como, mas o que sei é que é muito perigoso esse encontro neste momento
da sua vida. Você está reconstruindo a sua felicidade e precisa de um pouco
mais de tempo para ter a fortaleza e a dureza para enfrentar tudo o que a vida lhe
aguarda, mas agora, evite qualquer contato com o Brasil, com Pernambuco ou com
sua origem”
Claire ficou preocupada. O passado está em rotação com o
presente. Mascomo?, perguntava-se e não encontrava a resposta. Mas percebeu que
tinha que prestar atenção aos conselhos do Pajé.
Imediatamente escreveu a resposta. Agradecendo os bons
desejos e dizendo que ficaria atenta aos seus conselhos. Se dependesse dela, o
passado não chegaria até ela, pelo menos não por enquanto.
Além de sua nova vida de casada e de trabalhar na sua
empresa, Claire começou a faculdade de Botânica no começo do outono na
Sorbonne. É claro que a referência e recomendação do pai contaram, mas a nova
Madame du Clermont fora muito bem nas provas de admissão, sendo ajudada em
grande parte pelo próprio pai e pelo marido. O começo do ano letivo foi para
Claire uma experiência desafiadora e nova, e ela gostou muito de se ver no
ambiente universitário como uma estudante. Teve a sorte de ter como tutor,
Monsieur Clany, um professor muito importante nos quadros docentes da
universidade e muito amigo de Gerard Dupont. Clany era doutor em botânica e
especialista em plantas tropicais, e também era um dos professores de Claire.
Era um homem gordo, de estatura baixa com grande bigode e calvo. A calvície lhe
dava um ar de intelectual, mas também era muito engraçado quando queria. Claire
reunia-se com ele pelo menos três vezes por semana e Clany notou rapidamente
que sua aluna era brilhante e os conhecimentos que tinha das plantas tropicais
brasileiras era impressionante. Em pouco tempo, Edouard Cliny influenciou sua
pupila no solitário, mas prazeroso trabalho de pesquisa cientifica que ela
abraçou com empenho e afinco.
Era comum que o novo casal seja apresentado a alta sociedade
parisiense após a viagem de lua de mel. Os Clermont pertenciam à aristocracia
rural francesa e tinham muitos laços de amizade e contatos de negócios com
membros da sociedade cujos tentáculos além do social e cultural, abrangia
também econômicos e comerciais.
Após terminar o verão, era necessário receber e ser recebido.
Um jantar na casa dos Condes de Luen, dos Marqueses de Coigny, dos embaixadores
da Grã Bretanha, almoços com os membros do Instituto de Economia e Industria,
do Clube Militar, e de várias associações culturais como o Instituto de Belas
Artes.
Além de receber vários convites para participar de festas e
eventos sociais como reuniões de Damas da Caridade, Corrida de Cavalos,
Torneios esportivos e muito mais, também deviam, de vez em quando, ir a
inaugurações e exposições de arte.
Exposições no Palácio das Artes deviam ser aceitas porque as
Industrias Clermont eram patrocinadores e apoiadores da Instituição por muito
tempo. Nem sempre Claire, que agora estudava e trabalhava muito, podia
acompanhar o marido, mas neste caso em particular a insistência dele foi
premiada pelo sorriso da mulher.
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