segunda-feira, 5 de maio de 2014

ALMA, A FILHA DO DESTINO (CAP.IV PARTE IV)



Martine Deveraux era uma estudante da Sorbonne, que aos vinte e dois anos era considerada uma das alunas mais brilhantes de botânica quando o jovem Gerard de vinte e três a conheceu. Ele estudava biologia e estava no último ano. Uma noite de abril, na escadaria leste do teatro, Gerard chegava atrasado para uma peça de Monsieur Gentile sobre a Revolução Francesa. Ele sentou ao lado da moça loira e olhos azuis que sorriu quando ele perguntou se podia se sentar ao seu lado.
Nenhum dos dois poderia imaginar que era o preludio de uma história de amor. Gerard e Martine começaram a namorar, e depois de formados e trabalhando juntos na Universidade, ele no departamento de pesquisas biológicas e humanas, e ela como professora da cátedra de Botânica Elemental do primeiro ano, decidiram se casar. O pedido fora feito após sete meses do primeiro encontro naquela noite no teatro da Universidade. Um dia frio de novembro num café da Rue Valette, Gerard a pediu em casamento. A partir desse momento, nunca mais se separaram.
Alugaram um pequeno apartamento perto da Universidade, na Rue Racine, e portanto muito perto dos Jardins de Luxemburgo, onde costumavam fazer piquenique quando fazia bom tempo. Adoravam Paris. Martine havia nascido em Marselha mas veio morar na capital desde os sete anos. Moravam em Montmartre e era filha única do padeiro Bertrand Deveraux e de bela cantora francesa Fabiane Troier.  Já o Gerard tinha nascido no bairro de Saint Germain des Prés.
O pequeno apartamento era perfeito para os dois acadêmicos. Mas, quando Martine ficou gravida, eles compraram outro apartamento ainda mais perto da Universidade. Esta vez, na Rue Danton, perto do Boulevard Saint Germain. O prédio tinha só quatro andares e o casal mudou-se para o primeiro. Tinha uma sacada magnifica que dava para a rua, onde um café delicioso, o “Café des artes”, onde as tardes, após o trabalho, o casal ficava horas conversando. “Às vezes, alguns colegas da Universidade os acompanhavam. Enquanto o estado de gravidez de Martine a permitia, eles sempre saiam durante as noites para reencontrar velhos amigos, todos procedentes da Sorbonne ou da Universidade de Lyon; ou do Instituto de Biologia de Marselha, ou até mesmo, do Instituto Pasteur. Eles iam com frequência ao restaurante “D’or”, perto do Bois du bologne, e terminavam sempre no “café des artes”.
O trabalho dava prazer, e durante a semana eles estavam literalmente submersos em projetos, estudos, analises e materiais acadêmicos. Quase sempre tinham que presidir uma palestra, ou participar delas, ou administra-las.
O apartamento era pintado de azul claro, uma sala grande, um quarto, um banheiro, uma cozinha pequena mas aconchegante e um estúdio onde em dois escritórios, Gerard e Martine trabalhavam nos seus projetos acadêmicos.
Martine estava escrevendo um livro sobre plantas tropicais da América do Sul, especialmente da região da Amazônia brasileira, e Gerard estava submergido num projeto de espécies tropicais africanas. Em fim, os dois tinham a mesma paixão: a ciência.
Foi então, quando chegou o momento de Martine dar à luz. Sua mãe estava com ela quando no Hospital de la Tournelle, Martine enfrentou horas de agonia. A criança estava quase estrangulada pelo cordão umbilical. Os médicos fizeram o possível, mas o bebê nascera morto. Era uma menina, uma linda menina que eles queriam chamar de Claire. Após o parto, subitamente a pressão arterial de Martine subiu e ela morreu em decorrência de uma parada cardíaca. Ao mesmo tempo, Gerard havia perdido a mulher e a filha numa noite terrível de inverno. A tempestade havia-se desencadeado sobre o pobre biólogo. A partir daí tudo tinha mudado. Ele perdeu a vontade de viver em Paris, perdeu a vontade de seguir com seus projetos acadêmicos. Mas, Monsieur Tourval, seu chefe no departamento de biologia, achou melhor ele se afastar um pouco e viajar, mas sem perder o rumo das pesquisas. Gerard aceitou, e assim, menos de um ano após a morte de Martine, ele viajou para a África e depois para a América do Sul.
 A viagem que duraria somente três anos, transformara-se numa jornada sem volta de quase dez. Gerard nunca mais mencionara a mulher nem a filha. Os eventos terríveis de Paris ficaram no esquecimento. Mas agora, os fantasmas do passado pareciam voltar na forma de uma menina de apensas dezessete anos. A presença de Alma Rocha fixara na sua mente a possibilidade de retornar às origens, retornar a Paris. Com as imagens do passado que voltavam à sua mente, conseguiu, por fim, dormir. Amanhã, pensou, era outro dia.
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