Paul apareceu pontualmente na casa dos Dupont aquela noite
gélida de outono. Não chovia, mas ventava muito e a sensação de friagem era
demais. O jovem chegou com seu chapéu e sobretudo azul que combinava com seus
olhos. O jantar estava quase pronto.
Gerard surpreendeu-se com Claire porque ela fez questão de preparar tudo com a
ajuda de Joan. Margarete tinha ido a Seine-Port no dia anterior e Claire estava
concentrada na loja. Mas nesse dia, Joan e ela saíram às compras e como a amiga
cozinhava muito bem, Claire não teve dúvidas de pedir ajuda.
Paul e Gerard estavam tomando vinho quando Claire apareceu de
avental vindo da cozinha.
- Olá Paul
- Olá Claire, então você é a cozinheira de novo?- disse
sorrindo
- Mais ou menos, tive a ajuda da minha amiga Joan. Ela está
batalhando com o forno. Mas fique a vontade, já volto.
- Obrigado.
Naquela noite, Paul se mostrou tão agradável ela que, quando
ele foi embora, Joan não teve dúvidas de que o rapaz estava apaixonado pela
Claire, mas ela não mencionou nada à amiga. Preferiu guardar suas intuições
para si.
A vida tem seus mistérios e passamos a metade da nossa
existência sem sequer tentar entende-los. Tudo o que Claire havia passado
parecia estar no esquecimento. A moça estudava e trabalhava, aparentemente com
normalidade. O nome de Henri Brigny continuava não sendo mencionado, Paul Du
Clermont era um grande amigo que sempre mandava cartas, e assim, a vida de
Claire Dupont adquiriu um tom mais tranquilo.
Margarete voltou de Seine-Port após quatro dias e percebeu
que a loja fora muito bem administrada por Claire e Joan. Ela estava pensando
em aumentar o salário de meio período que elas ganhavam. Joan ficou satisfeita,
Claire agradeceu, mas para ela tudo isso era indiferente.
Numa tarde escura de quase inverno, quando a cidade já se
preparava com as luzes natalinas, Claire conseguiu uma mistura de essências e
assim, produziu o seu primeiro perfume. Margarete ficou encantada, Joan
exultante, quando chegou o perito em essências para dar o seu parecer. Ele
disse à Margarete que nunca tinha visto um perfume tão suave e tão atraente ao
mesmo tempo. Claire ouviu satisfeita o seu parecer.
- Mademoiselle, sua criação é excepcional. Seu aroma é suave
como uma tarde quente de verão e ao mesmo tempo, forte como o vento, como as
aguas de um rio perigoso e tentador. Temos que escolher um nome para ele.
- “L’Essence d’Assise” – disse Claire sem pestanejar para
surpresa de Margarete e de Joan.
- Muito bem, então registraremos seu novo perfume. A
Perfumaria Brigny acaba de lançar sua primeira fragrância. Parabéns.
Pela primeira vez, Claire conseguiu sorrir. O seu primeiro
perfume era dedicado a Saint Assise onde ela foi feliz com Henri.
O natal se aproximava e Claire percebeu que tinha que dar
mais atenção ao pai que estava com uma gripe terrível devido aos ventos
gelados. Apesar de ainda não ter cinquenta anos, Gerard Dupont trabalhava muito
e nunca se cuidava na saúde. Três dias atrás voltava da faculdade quando pegou
uma chuva gelada, e claro, tudo isso contribuiu para um forte resfriado que se
transformou em gripe. Nesses dias, Claire cuidou do pai, não foi trabalhar na
loja e também tinha que estudar para as provas que estavam começando. O mês de
dezembro foi o primeiro mês realmente gélido que Claire tinha passado em Paris.
Foi então que, num desses dias frios de dezembro, chegou uma
carta de Clermont. Jean e Paul convidavam pai e filha para passar o natal em
Royat.
- O que você acha minha filha?
- Não sei, eu estava pensando em passar o natal aqui com
Margarete. Você sabe que será o primeiro natal após tudo o que aconteceu e não
gostaria de deixa-la sozinha. Ela é forte e tem dado provas de que está
superando sua dor, mas nos dois sabemos que isso só pode ser fachada.
- Tem razão minha filha. Margarete precisa de nós, além do
mais não gosto de me ausentar de casa nesta época. Tenho ainda muitas provas
que corrigir e não universidade temos muitos eventos, mas podemos fazer assim.
Que tal se aceitamos o convite para o final do ano?
- Boa ideia. Pra mim, final de ano não significa muita coisa,
mas como você disse, Royat é sempre uma boa ideia.
- Escreverei para Jean, hoje mesmo.
Após o jantar, observou a filha estudando, ensimesmada nos
livros, e se perguntou se alguma vez ela não pensava na sua vida passada no
Brasil. Mas era evidente que ele tinha feito um bom trabalho, pois, ao parecer,
Claire tinha esquecido da sua trágica vida e de sua família na longínqua Inajá.
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