Termópilas foi batizado com esse nome devido a guerra, na
antiga Grécia que o professor Homero era fã incondicional. O conflito ocorreu
no ano 480 a.c.,entre as tropas do Rei Leônidas da Esparta e o Rei Xerxes da
Pérsia. Amante da História Antiga, ele balançou entre alguns nomes famosos da
história como Napoleão, Nabucodonosor, Hammurabi, Salomão, Leônidas, entre
outros. Mas na noite em que o cachorro ficou bom e começou a andar sem mancar,
ele estava lendo uma passagem da batalha de Termópilas e olhou para o cachorro
e ensaiou o nome. O vira-lata atendeu pelo nome, e assim, o cachorro ficou
chamado como Termópilas.
Começava então uma amizade que Homero nunca acreditou que
viveria mais. Termópilas não só era um companheiro fiel, era um verdadeiro
amigo. Dormia num colchonete felpudo na sala, perto da lareira e todas as
manhãs subia as escadas e entrava no quarto do dono para acordá-lo.
- Termópilas, vamos preparar o café da manhã.
A rotina era seguida religiosamente. Depois do café,
Termópilas ficava no jardim da casa brincando e correndo atrás de borboletas e
pássaros, até a chegada de dona Elvira que lhe preparava o almoço. A empregada
chegou a amar o cachorro e sempre que podia, brincava com ele no jardim após
terminar as tarefas do dia. As vezes ela levava o cachorro quando ia as compras
no açougue, no mercadinho ou até mesmo na frutaria da cidade. Termópilas
adorava passear.
Mas sua felicidade era plena quando, exatamente as 17.30, o
professor Homero chegava à sua casa. O cachorro pulava no colo do Homero com
alegria e depois de um obrigatório cumprimento bem circense, Termópilas
sossegava e ficava sentado na sua colchonete observando seu dono.
Uma amizade é capaz de transformar vidas, vidas secas e
áridas que estão entretecidas pela chatice, a falta de vontade e a tristeza. A
amizade com um cão é a mais desinteressada que existe na face da terra. Ela é
pura e, apesar de ser mais unilateral, a necessidade de proporcionar companhia
e ternura substitui todo tipo de vã filosofia na tentativa de explicar a origem
e a razão da convivência humana.
A amizade entre Homero e Termópilas transformava a vida dos
dois. O amigo de Termópilas era nada mais e nada menos que um homem necessitado
de carinho e de companhia. O amigo de Homero era um ser totalmente livre de
ambiguidades e de razões, só necessitava de companhia, de carinho e de um olhar
de cumplicidade.
A vida é feita de luzes e sombras, e as vezes as sombras
deixam na alma um rastro de medo, de desequilíbrio, de tensão. O professor
Homero voltou pontualmente as 17.30 e Termópilas não saiu para recebe-lo. Ele o
chamou por toda a casa, perguntou pros vizinhos, ninguém tinha visto o
cachorro. Ele começou a se desesperar. Ligou para a polícia, ligou para dona
Elvira. Esta lhe disse que Termópilas estava no quintal da casa quando ela
tinha terminado seus afazeres, as quatro da tarde.
Homero começou a passar mal, sentiu o coração quase sair pela
boca. Os vizinhos o ajudaram a procurar pelo cão. Nada de Termópilas.
A noite tinha chegado rápido, e ninguém sabia do paradeiro de
Termópilas. Ele continuava procurando pelas ruas, pela praça, perguntando a
todos os conhecidos, a todos com quem encontrava nas ruas. Nenhuma notícia.
Voltou triste e cabisbaixo para casa. Não dormiu nada. Ligou
para o colégio e disse que precisava ter o dia livre para resolver uma urgente
questão pessoal. Foi até a Prefeitura e perguntou se a carrocinha não pegou
nenhum cão na rua. A negativa foi recebida com certa apreensão. Termópilas,
simplesmente fugiu.
Seguiram três dias desesperadores, até que, dona Elvira
recebeu a visita de um rapaz que lhe deu informações do cachorro. Ele tinha
visto um labrador cor de mel vagando pelo bairro do Gás, bem longe do centro.
Dona Elvira ligou para o colégio e contou a boa notícia a Homero. Ele saiu como
um raio na hora do almoço. Pegou um taxi e foi até o bairro operário do Gás.
Perguntou na padaria, no bar, na quitanda. Nada. Quando já estava prestes a
voltar para o colégio, ouviu um latido ao longe. Vinha de uma casa vizinha ao
bar da esquina. Correu até lá gritando o nome de Termópilas. Os clientes dos
bares saíram para ver o homem que gritava.
Entrou pelo pequeno portão de ferro cor cinza, que estava
semiaberto, e viu Termópilas amarrado a uma pequena árvore. A casa parecia
abandonada e suja, mas quando o cão o viu, começou a uivar de alegria.
- Termópilas, meu amigo, meu fiel amigo – disse recebendo as
lambidas de alegria enquanto o desamarrava.
- O que está acontecendo aqui – disse uma mulher idosa de
cabelos brancos e olhos escuros. – quem é o senhor? O que quer aqui?
- Senhora. Ele é o meu cachorro que estava perdido.
- Graças a Deus que o encontrou! - disse a mulher com alivio
– ele apareceu faminto há dois dias por aqui e eu o recolhi, mas queria fugir,
portanto tive que amarra-lo.
- A senhora é uma santa, obrigado, obrigado
- Tudo bem, leve o bicho logo, estou cansada de tantos
latidos.
Homero recuperou o amigo, e a alegria.
A noite, com o cachorro aos seus pés, pensou no pesadelo que
viveu nos últimos dias. Percebeu que a existência de Termópilas na sua vida era
mais do que um milagre.
Sob o vasto e profundo mistério da vida e das relações
humanas, existe um complexo mundo de incertezas, de alegrias, de tristezas, de
fortunas e tragédias. Estes são os ingredientes que fazem da vida algo único;
atraente e feliz por um lado, ameaçador e triste, por outro.
Dizem que viver a vida é um exercício hercúleo de sabedoria e
paciência. Quando me refiro a “viver a vida”, isso inclui todos os seres vivos
que, por natureza, vivenciam também como nós humanos, as alegrias e as agruras
do “viver”.
O professor Homero de Farias experimentou a dor e o medo de
perder o seu amigo Termópilas. O destino fez com que o encontrasse e, apesar do
desespero, a vida pareceu voltar ao normal.
Mas tudo que parece ser “normal”, muitas vezes não é. São os
desafios, ás vezes inevitáveis que a vida – ou o destino – nos colocam no nosso
caminho.
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