Paul du Clermont saiu até o terraço de sua casa e contemplou
o horizonte nesse entardecer de outono. A paisagem amarela e feérica trouxe à
sua mente a pequena Claire Dupont. Durante todo o dia, não deixou de pensar
nela. Claire era uma moça encantadora. Quando no café da manhã seu pai lhe
contou tudo o que acontecera com a filha de Gerard Dupont, Paul escutou com
atenção, depois sentiu uma profunda compaixão. A partir dali, pensou em como
ajudá-la a se recuperar e sair desse momento tão duro e difícil.
Antes do jantar, enquanto esperava o pai, ele via como a
paisagem do outono em Clermont-Ferrand proporcionava um ambiente bucólico e
melancólico. As folhas amarelas cobriam as arvores perto das montanhas, na
cidade, as luzes iluminavam a tarde, quase noite. Enquanto meditava sobre o
assunto, chegou a conclusão de que iria a Paris falar com a Claire. Era hora de
prestar o seu apoio, seu ombro amigo. A final de contas, o que ele significava
para ela senão um bom amigo. Um bom amigo. As palavras brotavam na sua mente
mas com um gosto meio amargo. Ele desejava ser mais do que um amigo para ela.
Ele percebeu que a pequena Claire era objeto do seu desejo mais puro, do seu
amor.
Mas, por enquanto – pensou enquanto via o pai chegar – vou
ser o amigo que ela precisa. Quem sabe um dia.
Durante o jantar, falou dos seus planos para o pai.
- Amanhã vou para Paris. Vou visitar Claire Dupont.
- Ah e? Isso é muito bom – disse Jean bebendo uma taça de
vinho – pelo que soube dela, está num estado de tristeza lamentável. Não é para
menos. Pobre garota.
- Eu não sabia que ela estava namorando aquele rapaz
- O relacionamento começou no verão, um amor de verão. Bem,
pelo menos, não durou. O único que lamentamos é que tenha acabado desse jeito.
Gerard me escreveu dizendo que estava muito preocupado pela filha.
- Sim, por isso queria visita-la e ver em que poderia ser
útil.
- Faz bem, meu filho, é o correto. Vá ver o que pode fazer
por ela.
*******
Nos dias seguintes, a chuva parou de cair sobre a cidade, mas
as baixas temperaturas continuaram nesse outono estranho e melancólico, assim
como os dias cinzentos e nublados. No apartamento dos Dupont, Claire decidiu
voltar as aulas na próxima semana. Durante alguns dias, Joan a ajudava com as
lições. Na sala, Madame Brigny trabalhava nos aromas e Claire a ajudava. A moça
decidiu também ir até a loja e continuar o trabalho. Isso foi um milagre,
especialmente com a ajuda de Margarete que, como prometera, não deixou de
apoiar à moça.
Quando as duas caminharam pela Boulevard St Michel, em direção
à escola, Claire olhou para o rio Sena e a ponte. De longe, podia ver-se as
torres de Notre Dame. De repente, Claire pediu a Joan que a acompanhasse até a
ponte. Queria ver o rio. Desde a morte de Henri era a primeira vez que Claire,
emergindo do seu sofrimento, confrontava-se com as memorias tristes.
Caminharam uns metros e ali estava o rio Sena. Silencioso e
com correnteza suave que, em nada lembrava um rio perigoso. Mas para Claire, o
rio representava tudo aquilo de mal tinha acontecido na sua vida.
Olhou seriamente do alto da ponte. Duas lágrimas brotaram dos
seus olhos negros. Suspirou profundo e disse com voz aterradora, quase afogada:
- O que é que você esconde, maldito rio?
Deram meia volta em direção a escola. Joan ficou calada.
Claire ajudava Margarete escrevendo informações sobre
perfumes quando ouviu a campainha da porta principal. Foi atender. Era a
primeira vez em duas semanas que tendia à porta.
Paul du Clermont estava diante dela. Com um sobretudo azul e
chapéu elegante. Os olhos brilhantes de alegria a deixaram um pouco perturbada.
- Olá Claire, vim te visitar. Posso entrar?
- Paul!..claro, entra – disse meio encabulada.
O rapaz entrou e percebeu que Claire estava com alguém. Uma
senhora de meia idade, de óculos, levantou o olhar e sorriu.
- Bom dia..
- Bom dia Madame.
- Ela, ela é Madame Margarete Brigny. Estamos trabalhando com
algumas informações sobre ervas aromáticas.
- Prazer, Madame – disse Paul cumprimentando Margarete com um
aceno.
- O prazer é meu. Aceita um café?
- Obrigado.
- Vou preparar na cozinha. Já volto Claire.
- Obrigado, Madame Brigny – disse Claire convidando Paul a se
sentar.
- Então, como você está Claire? Eu soube pelo meu pai tudo o
que aconteceu e vim saber se você precisa de alguma coisa, qualquer coisa.
- Estou melhor. Obrigada. Obrigada por se preocupar. Obrigado
pela visita.
- Não precisa agradecer Claire, eu só vim ver você e saber se
precisa de algo. Somos amigos, e neste momento, os amigos são de grande
utilidade.
- Sim, é verdade. Como vai o seu pai?
- Está bem.
- Você vai ficar muito tempo na cidade?
- Sim, dois dias. Preciso resolver algumas questões de
negócios, como sempre. Mas também vim para te oferecer minha casa, caso você
queira sair da cidade. Você pode ficar lá o tempo que quiser.
- Obrigado Paul – nesse momento entrou Madame Brigny com uma
bandeja de café e biscoitos.
- Café para os dois.
- Obrigado Madame. – disse Paul. – muito gentil.
- Não agradeça, não é nada. Claire, vou verificar o que temos
para o almoço. Estarei na cozinha.
- Obrigada. Na verdade, agradeço o seu convite Paul, porém
agora será um pouco difícil. Na segunda feira recomeço minhas aulas na escola.
Perdi quase três semanas e senão fosse a minha amiga Joan Montreaux, estaria
perdida. Devo recuperar o tempo perdido. Mas agradeço, de verdade, o seu
convite, é uma oferta tentadora. Guardo lembranças lindas de Royat.
- Bem – disse terminando o café – minha oferta estará sempre
de pé e o meu pai também envia o convite e lembranças.
- Obrigada mais uma vez Paul. Diga a Monsieur Clermont que
agradeço muito e que pensarei com carinho sobre isso.
- Posso te ver amanhã, antes de partir?
- Claro, a que horas sai o seu trem?
- As quatro da tarde.
- Então venha almoçar com a gente. Papai estará aqui e ele
vai ficar feliz em te ver,
- Combinado.
- Estarei te esperando. Obrigada.
Paul ficou se levantou e deu-lhe um beijo no rosto e,
acenando para Madame Brigny que apareceu na porta da cozinha, saiu pela porta
da sala.
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