Meu caro herói:
Como não o conheço pessoalmente Francisco, ou melhor, “Chico”,
tive que ler uma crônica de Clarice Lispector ao seu respeito. Não tive o
privilégio de ser um “dos seus”, um intimo amigo, um conhecido ou um familiar;
também não conheço da sua vida para saber exatamente quem você é, mas isso não
importa, porque sou apenas um “fã” da sua arte e quando digo arte, me refiro
àquela com “A” maiúscula, àquela que é capaz de transformar não só uma geração,
mas muitas gerações.
Aprendi a gostar da MPB ouvindo as suas canções, e nunca
posso explicar ao certo o que elas provocam em mim. Talvez porque a sua obra
seja muito humana e todos nos identificamos com ela; talvez porque você é uma
espécie muito rara de ser humano que tem esse dom, de “provocar” grandes
transformações interiores em cada pessoa que te escuta e que escuta a sua obra.
Considero-o um verdadeiro poeta, “um poeta do cotidiano” (Meu
Deus, estou escrevendo com muitas “aspas”), porque você é um “poeta com aspas”.
Devo te dizer, humildemente, que entre a sua lista de música e poesia, adoro
uma em particular, aquela que fala assim:
“Ah, se já perdemos a noção da hora, se juntos
já jogamos tudo fora, me conta agora como hei de partir” (EU TE AMO).
Nunca uma música com nome tão bonito pode descrever em toda
sua extensão o maravilhoso milagre e mistério do amor.
Pois bem, Clarice Lispector (que recebeu sua visita algumas
vezes, segundo a crônica dela no JB) disse de você que era “gostável” e que tinha a coisa mais preciosa que existe: a candura.
Ela escreveu que pedia a Deus que a sua candura nunca seja ferida e que se
mantenha sempre. Depois de ler isso, posso sentir a sua candura nas suas músicas.
Isso é um dom Chico, um dom digno e apreciado por muitos.
Clarice também disse que você tinha um ar de “bom rapaz”,
desses que todas as mães com filhas casadoiras, gostariam de ter como genro, e
que esse ar de bom rapaz vem da bondade misturada com bom humor, melancolia e
honestidade. Ela tinha aconselhado você a buscar a solidão, senão seria
submergido, pois até o amor excessivo dos outros podia submergir uma pessoa. Um
conselho vindo da grande Lispector não é para poucos.
Não sei se você seguiu os conselhos dela, mas sei que a sua
obra continua sendo incomparável. Se um dia estivesse frente a frente com você,
gostaria só de te perguntar algo: Como é que alguém pode compreender tão
profundamente a alma feminina? Isso é algo que nunca deixei de admirar nas suas
canções e também nos seus livros.
Então, meu querido Chico, meu compositor favorito brasileiro,
só quero te parabenizar pelos seus “setenta” aniversário, (no passado mês de
junho) e, com os meus cumprimentos, gostaria de acrescentar aquele conselho da
Clarice, que, além da candura, você nunca perca a sua humanidade, pois ela é o
elemento essencial nessa difícil arte de compor.
De um “fã” um tanto malandro cuja vida (às vezes) é uma
ópera.
AGUSTIN
PS: Chico Buarque de Hollanda completou 70 anos em junho de
2014. O compositor inesquecível de “A Banda”, “Ópera do Malandro” e tantas
canções fundamentais na minha vida, também escreveu livros: BUDAPESTE e LEITE
DERRAMADO.
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