sábado, 22 de junho de 2013

ALMA, A FILHA DO DESTINO (PARTE IV)


Os dias foram passando entre uma tênue solidão e melancólica visão de futuro. As estações deram lugar aos anos, o inverno passou, as terríveis temporadas de secas deixaram marcas no velho rio Moxotó, como se fossem cicatrizes de sofrimento e tristeza.

Mas, como tudo na natureza, o verão voltou e trouxe chuvas e inundações no sertão. A família Malta também cresceu; especialmente as crianças, especialmente Alma. A menina que tanto amava o barro, voltou a encontrar o tesouro estranho e escuro que a fazia feliz. O barro, ela nunca entendeu ao certo, e talvez ainda era muito menina para entender o quanto gostava dessa terra escura que o rio lhe proporcionava a cada ano. Foi então, aos doze anos, quando a mãe, dona Dadá percebeu que a pele da filha tinha uma textura brilhante e nada incomum. Dadá Malta pensava que era um traço de família.

Então aconteceu algo inesperado e extraordinário. Alma desceu até o leito do rio e começou a se banhar nessa esplendida e calorosa tarde de março. O dia fora exaustivo. Ela ajudara o pai na venda no período da manhã já que era feriado escolar e tinha todo o tempo do mundo, especialmente para tomar banho e se lambuzar nas primeiras lamas do Moxotó.

O sol estava fulgurante. O calor, insuportável. Alma entrou no rio e se debruçou nele com alegria. Fechou os olhos porque os raios do sol dificultavam a  visão. Olhou para o outro lado do rio e pareceu ver uma sombra na beira, uma sombra estranha, como nunca vira antes.

Foi então que percebeu que tinha um homem muito velho  olhando para o infinito e parecia tão absorto  que não percebera a presença dela.

A curiosidade de Alma, no entanto aumentava a cada momento. Até que começou a nadar rapidamente em direção ao velho, e chegou ao outro lado do rio numa distancia discreta da estranha figura. Sentou-se na areia e olhou para o homem que, desta vez, percebera sua presença, mas, sem emoção, continuou o olhar ao infinito.

Alma levantou-se e caminhou em direção ao homem desconhecido. Ele parecia não vê-la.

- Boa tarde! – disse com voz juvenil.

O homem olhou para ela. Preparou um cachimbo que tirou do bolso da camisa velha que usava. Depois de acende-lo, olhou para ela com olhos misteriosos .

- Boa tarde moça...Gostou do presente que o rio lhe trouxe?

Sua voz era quase gutural, estranha e cheia de mistérios.

- Presente?, que presente?

- O prazer de tomar banho nas águas mornas do Moxotó...Isso é um presente da natureza.

- Sim....gosto muito de me banhar no rio, ele me acalma  e me deixa feliz.

- Parabéns moça...Você entende a natureza...Ela ainda te trará muitas surpresas boas. – disse levantando lentamente. - preciso ir andando, não se esqueça de passar barro em todo o corpo, isso a preparará para o futuro.

Alma viu o homem misterioso desaparecer na trilha que levava até o desvio do caminho da cidade. Ela não entendeu o que ele disse. Tudo parecia muito estranho. De qualquer forma, foi até o lamaçal e lá se entregou com aquela prazerosa atividade tanta satisfação lhe oferecia.

Não percebera que o entardecer chegara. Era o momento de voltar para casa.

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