segunda-feira, 31 de agosto de 2009

CLARICE LISPECTOR


Meu grande amigo Paulo César me deu de presente um livro da Clarice Lispector “A descoberta do mundo" crônicas escritas pela escritora para o Jornal do Brasil de 1967 a 1973, no meu aniversário em março passado.
Ele me disse : leia a Clarice quando estiver sozinho, porque você vai querer pensar muito sobre o que ela escreveu, e sozinho a meditação é melhor...

Na dedicatória, meu amigo escreveu :
“ Meu querido amigo, desde 67 que essas crônicas me freqüentam.........me povoam. Lia Clarice, ainda no Rio todos os sábados no Jornal do Brasil, nosso saudoso JB. Sempre impactantes, agora achei que você ia gostar de conhece-las. Um pouco por tudo que temos trocado, conversado, nesta vida de Deus!”

Devo confessar que não era a primeira vez que lia uma obra da Lispector. Tinha lido há muitos anos atrás a famosa “ A hora da estrela” e “Laços de Família”, mas naquela época, talvez pela idade, talvez por não estar na “freqüência” do meu amigo Paulo César, tinha devorado o manjar, senti o gosto dele, mas depois esqueci completamente o sabor.
Agora comecei a ler estas crônicas e , finalmente, conheci a Clarice na sua total e máxima expressão.
As crônicas foram penetrando na minha mente e na minha alma de forma incrível e gostosa. E senti a necessidade de escrever sobre esta escritora e sobre o porque gosto tanto dela.
Sempre achei, desde a minha mais terna infância, que nasci neste mundo mágico para mim, como um ser humano que devia aprender a cada momento mais e mais sobre a vida, sobre as pessoas, sobre a natureza. O meu espírito inquieto filosofava, desde pequeno, os mistérios deste mundo, e, tentando entende-los , me vi , muitas vezes meditando sobre os grandes problemas vitais do homem e da natureza.
Ao ler a Clarice, percebi que ela, assim como eu, tentava explicar ou entender tanto os mistérios grandes das nossas vidas, como os mais simples, o cotidiano, a rotina, o dia-dia do homem, as suas fraquezas, os sofrimentos, as agruras, as alegrias, as vitórias, os sentimentos...
Clarice nos escreve subjetivamente sobre a beleza que cada fato e rotina tem nas nossas vidas........Com palavras singelas, descreve a magia que envolve o cotidiano, as percepções do homem sobre os mistérios do dia a dia, com graça, com humor, com esperanças..
Ai, eu me identifico plenamente com ela. Desde a minha mais terna idade, eu tento ver “mais além” do simples fato de viver...Procuro encontrar o “por que” da existência do ser humano, através de pensamentos subjetivos, de meditações, tão simples mas verdadeiras.
Em primeiro lugar, fiquei encantado com uma frase da Clarice : “Amar os outros é a única salvação individual que conheço: ninguém estará perdido se der amor e as vezes receber amor em troca”
Amar, sem dúvida é a atitude mais sublime do homem.. .......E não precisamos receber sempre em troca amor. Amor é oferecido, sem receber nada em troca, mas quando, as vezes o recebemos, então nos sentimos salvos, é como se a justiça espiritual da nossa alma, tenha atingido a sua verdadeira dimensão.
Acordar, rezar, levantar, tomar café da manhã, ir trabalhar, encontrar amigos e jogar conversa fora – coisas tão triviais aparentemente – tomam uma dimensão especial quando se encontra nelas a magia, um sentido, algo que afague a sua alma e te faça feliz.
Quando fazemos algo, algum fato do nosso cotidiano, e o envolvemos de uma subjetividade especial, então damos um novo sabor ao acontecimento. Aproveitar cada momento das nossas vidas e coloca-las na nossa memória, guarda-la a sete chaves e, de vez em quando descobri-la para nos sentirmos bem, talvez seria um dos grandes segredos para ver a vida de forma mais leve, mais serena, mais feliz.
Assim, como a Clarice, também gostaria que, no momento da minha morte, segurar a mão de uma pessoa muito querida, para que possa fazer “ a passagem” de forma tranqüila e feliz. Sonhos e desejos simples, como simples deve ser a própria vida.
Assim como ela, acho que a minha condição é muito pequena e me sinto constrangido por isso...Também não anseio mais liberdade, pois na minha condição não poderia usufrui-la totalmente se tivesse mais liberdade. Quando penso que o sou um pequeno grão neste universo majestoso e profundo, me sinto ainda mais constrangido....mas, o meu “amar” as vezes, se derrama com tanta intensidade sobre os meus semelhantes, que ai sim, me sinto algo mais que um grão..
Portanto, o que será de fato SER neste vasto teatro da vida...............A Clarice, certamente escreveria sobre isso depois de uma longa meditação............Isto é profundo..........e talvez seja até impossível descreve-lo num simples e singelo texto como este. Talvez só resta SENTIR nas membranas mais íntimas do nosso “Eu”, da nossa alma.
Talvez a nossa vida seja tão ininteligível quando é o mar.....O mar, segundo a Clarice é “o mais ininteligível das existência não humanas”, ou talvez o milagre de VIVER, de captar o essencial dos acontecimentos ao nosso redor, seja tão simples como acordar, conversar, comer, ler, dormir.....
As vezes, raras vezes, percebo que a minha vida não entrou no túnel da mediocridade, quando, por milagre, me encontro em uma freqüência de felicidade inexplicável, me sinto leve,muito leve...Fecho os olhos e saboreio a plenitude de existir, de SER totalmente EU...A minha lucidez, sem esforço, sabe o que estou sentindo. É como se recebesse um acúmulo de estranha energia, que me faz sentir plenamente VIVO, o meu corpo parece flutuar, como se estivesse numa espécie de crepúsculo extraterrestre e pareço sentir tudo o que existe.....me sinto plenamente vivo..........As poucas vezes que senti isso, não tinha palavras para explicar. Era profundo demais....Ai, a Clarice definiu esse estado como ESTADO DE GRAÇA.........Então pude entender na real dimensão o que era aquilo.... .E assim como ela, não quero que se repita muitas vezes, só algumas, porque poucas vezes, pode ser o suficiente.

Clarice, se você estivesse viva, certamente ousaria escrever-te uma carta, contando todos os meus anseios e dúvidas........Mas, através dos teus escritos posso, de certa forma, encontrar algumas explicações ao meu maravilhoso milagre de viver e ser. Obrigado por isso.

DOIS POMBOS


DOIS POMBOS

Certa manhã fui correr no Ibirapuera e vi dois pombos. É sabido que os pombos voam , e sempre voam quando alguém se aproxima deles. Mas quando eu passei pertinho dos dois pombos, eles simplesmente ficaram impassíveis...não voaram...Pensei qual seria o motivo para que essas aves – que voam porque tem asas –chamadas POMBOS, não voaram....Talvez estariam cansados demais, talvez com preguiça, ou talvez não quereriam voar porque estavam sem vontade..
As vezes me sinto como esses pombos.As vezes não quero voar...não quero usar as minhas asas...Sinto que elas estão pesadas demais, ou talvez eu esteja cansado demais.Mas nunca deixo de voar por causa da tristeza, simplesmente não tenho vontade....E isso é humano, muito humano, demasiado humano.